domingo, 25 de novembro de 2012

Dia de verão

O peixinho ficou no cesto. A alegria era tanta que ela mal se conseguia manter quieta para o apanhar. Com muito cuidado saiu do rio. Escorreu-lhe a água e, lá no fundo, estava um minúsculo peixinho, muito menor que um carapauzinho dos que é proibido apanhar e que, mesmo assim, às vezes, encontramos numa qualquer tasca, frito e acompanhado por um arroz de tomate malandrinho.
Mãe, apanhei um peixe mãe! Olha mãe!
Oh filha, isso é tão pequeno, o que é que vais fazer com ele? Deita-o fora, isso não serve para nada.
Não, mãe, vou levá-lo, vou assá-lo e vou comê-lo ao jantar. 
A mulher ria-se, encantada com as certezas da filha. O que mais desejava era que ela fosse feliz. O pai estava tão longe, lá para o Brasil. Que saudades tinha do único homem da sua vida!
A menina tinha seis meses quando ele se foi embora, portanto não conhecia o pai.
As cartas, apesar de muitas, eram tão poucas! Oh rapariga, olha a tua roupa a ir pelo rio abaixo. Parece que estás no mundo da lua! Esta gente nova...
Obrigada tia Lucinda. Levantou-se, agarrou a saia e foi atrás da roupa que lhe fugia arrastada pela correnteza.
Mãe, o meu vestido! Mãe, olha a saia da avó! E ria-se. Chapinhava na água límpida do Tuela, correndo atrás da roupa.
Quando tudo voltou à normalidade, mãe, filha e demais comandita sentaram-se para comer as singelas merendas. A roupa estava à cora. O sol apertava. Era necessário acabar de a lavar e pô-la  a secar para que, pelo menos, escorresse. O caminho até à aldeia era íngreme e exigente. A trouxa era grande e se a roupa estivesse molhada, mais difícil se tornaria.
As mulheres afadigavam-se para que tudo estivesse pronto a boa hora. As crianças brincavam. A menina guardava cuidadosamente o seu "enorme" peixe.
Fim do dia, lusco-fusco, trouxas atadas e colocadas à cabeça. Ai que isto pesa Senhor!
A subida é penosa. A alegria esvai-se com o cansaço. As crianças já não riem. Vão devagar. Cada uma leva a sua pequena trouxa. Os mais pequeninos vão pela mão das mães. Impressiona a força destas mulheres.
Chegámos, graças a Deus! Até amanhã raparigas.
A menina corre pela rua acima. Leva muita pressa. Ana, oh Ana! Que queres? Olha o que eu trouxe. O quê?
Abriu a pequenina mão e mostrou o peixinho. A tua mãe tem o lume aceso? Tem. Vamos assá-lo? Vamos!
Felizes como um dia de primavera correram para casa e, finalmente, realizaram o desejo de um dia inteiro.
Comeram-no. Nunca mais saborearam nada assim.
Era noite. As estrelas cintilavam no imenso azul, negro como um abismo.

Maria Videira (Mara Cepeda)

Sem comentários:

Enviar um comentário