Agosto quente, aquele. Tornava a vida difícil a quem não tinha outro meio de subsistir para além do trabalho árduo, nas poucas terras que possuía.
O mais difícil era arranjar água onde nem gota havia. Os tempos eram outros e aquela pequena localidade tinha de se bastar a si própria, já que não existia água de rede.
Só muitos anos mais tarde é que a câmara fez a captação de um enorme nascente localizado no Serro. Hoje não há problemas de falta de água, mesmo quando regressam todos os imigrantes, e são muitos, para matar saudades da sua Terrinha.
Lá vinham elas, abrasadas e céleres, a menina pela mão, já cansada e a pedir colo. A mãe, cansada também, sabia que não podia adiar muito mais, pegar na filha. Que calor inclemente! Porque terei eu trazido este anjo comigo? Nunca mais aprendo.
Mãe, tenho calor e tenho sede. Estou tão cansada!
Está bem filha, vamos lá, só mais um cibinho. Estamos quase a chegar e já bebes água.
Sim, mãe...
Com a menina ao colo, a mulher quase corria. Parecia que qualquer coisa não estava bem, não sabia explicar, era um sentir... uma sensação estranha.
Estava muito cansada. Mais do que ver, intuiu o sol a turvar-se, tudo escureceu, um vento rude e quente fustigava-lhe o corpo. De repente, como se o inferno se abrisse, rebentou a trovoada que estrondeava como se o mundo fosse acabar, os raios cegavam. Começou a chover, bátegas grossas como punhos, quentes como caldo. Em poucos minutos estavam encharcadas. A aldeia nunca mais se deixava ver.
A chuva era tanta e tão forte que em pouco tempo corriam ribeiros pelos caminhos, apareciam pequenas cascatas que galgavam montes e fragas e se despenhavam sem dó onde calhava. Pedras desciam pelos campos em declive. A mãe reflectia no olhar o pavor que sentia.
Minha Santa Bárbara, minha mãe, protege-nos!
Mãezinha, tenho medo!
Já vejo a aldeia filha. Já estamos a chegar. Vamos buscar a Santinha. Vamos pô-la à porta da igreja. Vais ver como a trovoada pára. Podes andar um bocadinho agora?
Colocou a filha no chão e, mão na mão, correram até à pequena capela. A porta, naquele tempo, estava, sempre, aberta. A mulher precipitou-se para o altar de Santa Bárbara. Pegou nela com cuidado e respeito e rapidamente a levou para a porta.
Como por milagre, quase de imediato, a negritude do céu começou a esvair-se, os raios de sol romperam as trevas, a chuva começou a abrandar...
A Santa parecia sorrir. O verão voltava em todo o seu esplendor.
Maria Videira (Mara Cepeda)
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